Osório César foi um dos primeiros psiquiatras brasileiros interessado em estudar a arte produzida por pacientes psiquiátricos, tendo iniciado esses estudos nos anos 1920 no Hospital do Juquery. Seu nome e seus trabalhos estão quase esquecidos. Este blog procura divulgá-los.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Capítulo 4 – Parte 3 – A Expressão Artística nos Alienados


...continuação do texto...

História Psiquiátrica de um Doente com Delírio Místico

Vejamos um curioso relato escrito por um outro parafrênico, com o fim de ser publicado em todos os jornais do mundo, acerca dos acontecimentos de sua vida.

                                 “Prova – nova”.
“Sua Exa. Revma. D. Duarte Leopoldo e Silva. Mto. Digo. Arcebispo da Diocese de S. Paulo anunciará ao mundo a boa nova”.
“C.V.R. filho de pais espanhóis; católicos: apostólicos romanos. Obedientíssimo a todas decisões dos papas ou sumos pontífices de Roma, em matéria de religião. Casou-se em Santos no ano 1904. Para casar, antes do ato matrimonial, confessou C., e C. .,; suas culpas e pecados. Ligado o C., a sua esposa, com ataduras que só o céu pode desatar; roga ao Céu: que lhe desse fruto de salvação”.
“Teve 4 filhos com vida este casal. Recebendo todos o Santo batismo da Igreja Católica em Santos e em S. Paulo. C., pouco tempo depois de casado, entrou num estado de vida profana: sumamente pecaminoso”.
“Os seus empregos não davam tempo para assistir a atos religiosos da Igreja Católica. Apenas batizou filhos. Em sua casa, sempre rezou. Porém, pecou? Vida sumamente suja e imunda. Aparentemente, caráter de Santo ou Sepulcro esbranqueado. Interiormente, C. era um poço de malícia infernal. O C. caminhou em sua perversidade; pouco tempo depois de seu casamento! Ano 1904: até Outubro de 1915. C., por causa de suas iniquidades; foi açoitadíssimo pelo Céu: pelo inferno e pela morte. C., a vista dos sofrimentos, padecimentos e perseguições; teve sempre uma coragem de Leão. Mas sua esposa enferma, dobrou e humilhou o grande pecador C. E em Outubro de 1915, agradou ao Céu a sua Conversão. Como se deu a conversão de C.? Ato sumamente maravilhoso e Celeste”.
“Viajava C., em pé, na plataforma do Bonde da Penha; em demanda do bem amado. E o carteiro C., em dado momento, ficou sozinho na plataforma”.
“O condutor do Bonde achava-se ocupado em seu trabalho. O C., em voz bem inteligível, ouviu as seguintes palavras. Homem, volta-te para Deus! ; que só Deus te pode salvar!! O C. ia no bonde a procura de remédio para sua esposa. Ouvindo o que ouviu, murmurou em si mesmo. Vou a procura de remédio para salvar a esposa e eu sou o perdido. Sou um desgraçado, vou confessar-me. Não procuro mais o benefício da cura de minha esposa, com a tal pessoa. Vou lá em sua casa e digo estas palavras, faço estas perguntas e ofertas. E volta já para casa, cheio de temor, murmurava em pensamentos; vou confessar-me. O C., crer firmemente que Deus havia de curar sua esposa, pelo seu arrependimento. Fez o seu exame de consciência e ao terceiro dia confessou-se com Dr. Conego Mel. Meirelles Freire, na Igreja de São João Baptista, Braz. Desde Outubro de 1915, data de sua conversão a 23 de Agosto de 1921, cheio da virtude Celestial que nele reside; fez o C. diversas obras: que devem ser publicadas nos púlpitos das igrejas Católicas. As tais obras Celestes, feitas pelas mãos de C., em união com N. S. J. Cristo; dão claro testemunho da santidade do pecador maior do mundo: convertido pela Sta. Bondade de Deus. A Igreja Católica, por meio de meus confessores, não conhece tais obras da caridade: feitas sobre a humanidade. Estão ocultas. O C. oculta-as tudo, até a presente data. D. Duarte como chefe superior da Diocese de São Paulo, venha ao hospício. Encher-lhe-ei seu coração de obras, para pregar nos púlpitos sagrados. C. acabou de compreender que foi joeirado por satanás desde Outubro de 1915 a 6 de Outubro de 1920. E desde 6 de Outubro de 1020 a 22 de maio de 1922, tirou satanás de C., servo de N. S. Jesus Cristo: muitas provas para a sua melhor orientação. C., o servo de predileção Celestial; foi santificado em S. Paulo. Em 4 de Outubro de 1921, foi conduzido para o hospício Juqueri; localizado neste deserto, C., além de muitos jejuns rigorosos, jejuou 40 dias com 40 noites sem comer nem beber coisa alguma deste mundo: na Quaresma de 1926. Iniciou-se o jejum em 17 de fevereiro. E terminou em 28 de Março do referido ano. Em 15 de Maio p. p. preguei um Sermão no terceiro pavilhão do hospício, denominado Sermão da Montanha ou Deserto”.   
“D. Duarte, quero muito em breve trabalhar publicamente pela salvação das almas, previne a S. Exma. Rvma. D. Duarte, para evitar as dolorosas operações de satanás, que por má ventura sugeriu em espírito. Caso frieza para não dar passos sem atenção a esta Celestial obra. Lembre-se que é satanás inimigo das almas, infundindo falta de animo; para não obrar”.
“Importa que S. Rvma levante-se de sua cadeira apressado e dê passos para conduzir o C., para São Paulo. Do Servo Amantíssimo de NSJ Cristo, por santos trabalhos de ordem Celestial. S. Sta. Benção. Em nome de Padré, Filho, Espírito Santo. Amen”.

“Juquery 23 de Outubro de 1927”.                                “ C.V.R.”
                                                                          “3º Pavilhão do Hospício”