Osório César foi um dos primeiros psiquiatras brasileiros interessado em estudar a arte produzida por pacientes psiquiátricos, tendo iniciado esses estudos nos anos 1920 no Hospital do Juquery. Seu nome e seus trabalhos estão quase esquecidos. Este blog procura divulgá-los.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Capítulo 1 - Parte 7 - A expressão artística nos alienados


Continuação do texto...

Entre as crianças anormais o estudo dos desenhos tem particular significação para interpretações das psicoses de fundo sexual. São simples os desenhos dessas crianças e pouca diferença fazem dos desenhos dos escolares normais.
Fizemos o estudo das representações gráficas dos anormais do Pavilhão de Menores do Hospital do Juquery e chegamos à seguinte conclusão:
Entre 30 doentes, apenas conseguimos que 10 desenhassem, espontaneamente, sem modelo.
Esses desenhos são assim distribuídos:
1) R., de 21 anos, imbecilidade, desenhos de figuras humanas muito mal representadas (fig.12) idênticos ao de uma criança anormal de 4 anos.
2) B., 12 anos, imbecilidade, desenho sem forma bem caracterizada. Tem vaga aparência de uma representação animal (fig.13).
3) J., 14 anos, psicose epiléptica, desenho de figura humana, melhor caracterizado do que os anteriores (fig. 14). Os cinco riscos embaixo e de cada lado da figura representam dedos. Em cima da cabeça, a bola do meio representa o cabelo e os dois pequenos pontos, ao lado, piolhos.
4) V., 14 anos, psicose epiléptica, desenho regularmente acabado de uma figura humana (fig. 15). Como o anterior, este pode ser comparado ao de uma criança normal de 5 anos.
5) S., 15 anos, psicose maníaco-depressiva, desenho regular, mostrando uma figura humana vestida e uma casa com duas janelas e uma porta (fig. 16). Igualmente como o anterior, pode ser comparado a desenhos de crianças normais de 6 a 7 anos.
6) R., 12 anos, nevropata (encefalopatia infantil) desenho de um navio, mais ou menos bem feito (fig. 17). 
7) A., 15 anos, imbecilidade, nunca aprendeu a ler nem escrever. Desenho de riscos desordenados e em espirais, sem nenhuma significação pictórica (fig. 18).
8) J., 11 anos, imbecilidade, nunca aprendeu a ler nem a escrever. Desenhos de riscos esféricos e desordenados, sem significação pictórica (fig. 19).
Os dos últimos menores, também imbecis e analfabetos, fizeram rabiscos desordenados, como os anteriores.
Os 20 restantes anormais, imbecilizados em grau avançado, foram incapazes de produzir qualquer desenho por mais simples que fosse.
Os que desenharam as suas produções gráficas espontâneas, como vimos, foram formas humanas. As representações de origem vegetal (flores, frutos, etc) não verificamos em nenhum desses desenhos. Também não encontramos figuras obscenas nas garatujas desses pequenos anormais. 
É bem curiosa a semelhança que existe entre essas artes. Também não ficaria mal se colocássemos aqui a arte futurista. 
Por isso é que “nas realizações preconcebidas, nas intenções sistematizadas”, diz Porciúncula Moraes, “o novo, em arte, tem mais de três mil anos”.
“Aceitando que cada artista vê o mundo a seu modo, procurando, portanto, formas estranhas, formas originais para expressar novas sensações, é levado assim a nos dar o novo verdadeiro, o novo legítimo, o novo atualíssimo, que é o pessoal. Donde se conclui que a arte das crianças (podemos também acrescentar  –  dos primitivos e dos alienados) é nova novíssima. Como a maioria delas despreza a terceira dimensão, essa maioria se manifesta francamente futurista”.